Se você vive, trabalha, consome ou produz no Brasil, você é uma das milhares de pessoas que pagam, juntas, R$ 1,7 trilhão por ano pela ineficiência da economia brasileira. Esse é o tamanho do Custo Brasil, o valor que o setor produtivo gasta a mais do que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para produzir no Brasil. O Custo Brasil é como aquela gordura totalmente dispensável, não a da picanha, mas a do fígado.
O desperdício equivale a 20% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e é maior do que o PIB de vários vizinhos na América do Sul, como Paraguai, Bolívia, Uruguai, Venezuela e Peru. E, juntamente com a carga tributária brasileira, também é a resposta para indignações coletivas como, por exemplo, por que um celular é mais barato no Estados Unidos do que no Brasil.
Quando uma empresa leva entre 1.483 horas e 1.501 horas no processo de apuração, preparação da documentação, declaração e pagamento de tributo, um tempo muito superior ao de qualquer lugar do mundo, é a mercadoria e o serviço nacional que ficam mais caros. A má qualidade da infraestrutura, como a falta de ferrovias, explica o elevado custo do frete.
O fato de o Brasil ter o terceiro maior spread bancário do mundo, atrás apenas do Zimbábue e de Madagascar, de acordo com o Banco Mundial, também eleva o preço final de uma mercadoria produzida no país, pois ele impacta diretamente o custo do crédito, do financiamento para o capital de giro e investimentos das empresas. O spread é a diferença entre a taxa que banco paga para captar o recurso e os juros que ele cobra para emprestar. Dados do Banco Central mostram que, em maio de 2024, a taxa de juros média para empresas era de 18,2% ao ano.
“O Custo Brasil é o chamado custo inútil. É inútil porque não agrega nada para ninguém. É uma desvantagem relativa quando o empresário brasileiro vai competir com o produto estrangeiro tanto no mercado interno quanto no mercado exterior”, explica o vice-presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Leo de Castro.
A redução do Custo Brasil é a condição para recuperar a competitividade da indústria brasileira
A CNI, em conjunto com as 27 federações estaduais de indústria e com 74 associações industriais, divulgaram a Declaração pelo Desenvolvimento da Indústria e do Brasil. No documento, o setor industrial apresenta os 10 princípios orientadores para impulsionar a agenda de desenvolvimento do país. Cinco deles têm relação direta com o Custo Brasil: sistema tributário moderno e eficiente; custo de capital; recursos humanos capacitados para a nova economia; qualidade regulatória; e energia e transportes mais baratos e eficientes.
Aprovação de projetos pode reduzir em R$ 500 bilhões o Custo Brasil
O conselheiro executivo do Movimento Brasil Competitivo (MBC), Rogério Caiuby, conta que, há cerca de cinco anos, o MBC desenhou o Custo Brasil, em uma forma de mandala com 12 grandes seguimentos, para torná-lo visível. O desenho faz o caminho da vida de uma empresa e os obstáculos vivenciados da porta da fábrica para fora: abertura, financiar capital, contar com pessoas, infraestrutura, acessar insumos básicos como energia, segurança jurídica, questão tributária, participação em cadeias globais de valor, burocracia, inovação, competir e ser desafiado de forma justa e encerrar o negócio.
“A baixa qualificação dos recursos humanos é a parte que mais pesa no Custo Brasil, quando entram no mercado de trabalho. O segundo ponto que mais impacta é o fato de honrar tributos, seguido da falta de infraestrutura e logística. E vivemos uma dicotomia no caso da energia. Temos a matriz energética mais limpa do mundo, no custo mais baixo, que se torna cara devido aos encargos e perdas do sistema. É um custo muito real que drena a capacidade de competir do setor produtivo”, explica Caiuby.
“A ideia é manter atualizado o valor do Custo Brasil a cada dois anos e acompanhar projetos mais maduros para entender até que pontos eles têm a capacidade de entregar o que era esperado deles. Um exemplo é o acesso à banda larga. Temos um projeto que foi aprovado que é o 5G, mas ele depende de outro, bastante polêmico, que é a questão das antenas. Então estamos acompanhando para saber se, na próxima medicação, ele terá um impacto nesse ponto da comunicação”, explica Caiuby.
Reforma tributária vai eliminar distorções que reduzem a competitividade da indústria
O novo sistema de tributos sobre o consumo vai eliminar distorções que reduzem a competitividade da indústria, como a cumulatividade, o acúmulo de créditos tributários, a oneração dos investimentos e das exportações e os custos para calcular e pagar os tributos.
Na avaliação da CNI, será uma excelente mudança, principalmente neste momento em que o país discute como promover a neoindustrialização da economia brasileira.
Recursos humanos capacitados para a nova economia
Até 2025, o Brasil precisará qualificar 9,6 milhões de pessoas em ocupações industriais, sendo 2 milhões em formação inicial – para repor inativos e preencher novas vagas – e 7,6 milhões em formação continuada, para trabalhadores que precisam se atualizar. Isso significa que 79% da necessidade de formação nos próximos quatro anos será em aperfeiçoamento.
O mercado de trabalho passa por uma transformação, ocasionada principalmente pelo uso de novas tecnologias e mudanças na cadeia produtiva. Por isso, cada vez mais, o Brasil precisará investir em aperfeiçoamento e requalificação para que os profissionais estejam atualizados.
Em quatro anos, devem ser criadas 497 mil novas vagas formais em ocupações industriais, saltando de 12,3 milhões para 12,8 milhões de empregos formais. Essas ocupações requerem conhecimentos tipicamente relacionados à produção industrial, mas estão presentes em outros setores da economia.
Qualidade regulatória: economia brasileira precisa de sistema transparente, previsível e baseado em evidências
Regulamentos dispersos em mais de 30 órgãos do governo federal, sobreposição de regulamentos técnicos e regulamentação excessiva de itens são as principais dificuldades encontradas pelas indústrias no sistema de garantias da qualidade de produtos e serviços brasileiro. Os dados são da Sondagem Especial: Infraestrutura da Qualidade Industrial da CNI.
De acordo com a pesquisa, as principais dificuldades para as empresas se manterem atualizadas em relação às normas técnicas e requisitos técnicos são:
• grande quantidade de normas e regulamentos técnicos existentes (50% das respostas);
• grande quantidade de órgãos que produzem normas e regulamentos técnicos (29% das respostas);
• velocidade de mudança nas normas e regulamentos técnicos (25% das respostas).
A CNI ouviu 1,7 mil empresas das indústrias extrativa e de transformação. Destas, 704 são pequenas, 589 são médias e 407 são grandes.
“A reclamação do setor industrial não é sobre manter os produtos em conformidade com os padrões de qualidade, o que é visto como investimento e parte da atividade empresarial, mas sobre os pontos críticos elencados. É comum, por exemplo, a regulamentação de um produto sem que seja feita uma análise prévia, para identificar se ele representa riscos para o consumidor e para o meio ambiente”, explica a gerente de Estatística e Competitividade, Maria Carolina Marques.
A CNI avalia que essa análise é fundamental para reduzir os excessos. Ainda de acordo com a sondagem, para 65% das empresas entrevistadas, o sistema é considerado oneroso.
Energia e transportes mais baratos e eficientes
Os diversos subsídios e encargos embutidos na conta de luz do consumidor são um dos principais fatores para que o Brasil tenha uma das tarifas de energia elétrica mais altas do mundo. Pesquisa da CNI mostra que para 55% dos empresários industriais brasileiros, o excesso de subsídios do setor elétrico afeta diretamente a competitividade da indústria.
Outros 47% apontam que tais benefícios concedidos a determinados setores da economia – como a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), as Fontes Incentivadas e o subsídio para geração distribuída, são os responsáveis pelo elevado custo da conta de luz no país. Levantamento da CNI com base em dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) mostra que encargos somados aos impostos representam 44,1% do valor da conta de luz. Segundo os dados, os custos conjunturais (compostos pela Conta Covid e pela Escassez Hídrica) e estruturais somaram em 2023 um total de R$ 102,35 bilhões.
Dentro dos custos estruturais destaca-se a Conta de Desenvolvimento Energético. Criada em 2002, a chamada CDE impactou a conta de luz no ano passado em R$ 40,1 bilhões - em 10 anos a conta saltou de R$ 14,1 bilhões para a cifra atual. A CDE é um fundo setorial que tem como objetivo custear diversas políticas públicas do setor elétrico brasileiro, entre as quais subsídios para fontes incentivadas de energia, para o carvão mineral e para a geração distribuída.
Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo tem como bandeira a redução do Custo Brasil
A Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo foi montada em agosto de 2021 com o objetivo de discutir e propor medidas de enfrentamento ao Custo Brasil. Dos projetos que compõem a Agenda Legislativa da Frente, 70% estão alinhados com a pauta mínima da indústria, nas áreas prioritárias para a redução do Custo Brasil. Confira: